Agroecologia e Democracia unindo campo e cidade
Roça Agroecológica das Mulheres da Dandara (2011)
Roça Agroecológica gera autonomia das mulheres e segurança alimentar
Mulheres de Dandara na Luta pelos seus Direitos. É assim que se intitula o grupo da Dandara, formado por 7 mulheres, que desde 1999 desenvolve experiências agroecológicas numa roça comunitária, localizada no Assentamento Dandara dos Palmares, município de Camamu, no Baixo Sul da Bahia.
A história do grupo e da roça coletiva começou quando Maria Andrelice dos Santos, agricultora e integrante do grupo das mulheres, que na época atuava como líder pela Pastoral da Criança, teve a idéia de produzir alimentos para as crianças que sofriam com a desnutrição, diarréia e outras doenças. Del, como é conhecida na comunidade, lembra que no início do acampamento, em 1997, as famílias assentadas passaram momentos muito difíceis devido à falta de alimentos e as crianças eram quem mais sofriam. Foi então que a agricultora, junto a outras 20 mulheres, solicitou à Associação Comunitária um lote de 4 hectares. A doação da área foi aprovada e em 1999 o grupo das mulheres começou a produção.
Com o apoio de algumas entidades, como o SASOP e a Pastoral da Criança, o local que era antes uma fazenda de cultivo de cacau e, por ser monocultura, não havia o que comer, passou a ter uma grande diversidade de plantas, como mandioca, cupuaçu, banana da terra, café, feijão, batata doce, gergelim, milho, abacaxi, urucum, entre outras. As entidades assessoraram na produção do viveiro de mudas de frutíferas, no manejo agroecológico e na gestão de um fundo rotativo para compra de insumos, sementes e ferramentas, o grupo deu início ao trabalho em mutirões.
O grupo implantou o roçado com o manejo agroflorestal regenerativo, já que se trata de uma região rica em biodiversidade da Mata Atlântica. De início, houve certa resistência por parte de algumas mulheres do grupo por não conhecerem essa proposta de manejo, mas as primeiras experimentações mostraram que se tratava do melhor manejo. O mato era roçado e o solo protegido por plantas nativas. O maior desafio inicial, no entanto, foi convencer as companheiras a não usar veneno para o controle de formigas e adotar no lugar o manejo de plantas como a comigo-ninguém-pode (Dieffenbachia Picta Schott), o roxinho (Euphorbia Cotinifolia) e a manipueira (água extraída da mandioca).
O descrédito dos homens da comunidade também foi um marco do momento inicial. Havia o desrespeito às mulheres e à opção de manejo que elas tinham escolhido, o manejo agroecológico. Além de dificultar a experimentação das práticas agroecológicas no assentamento, a atitude foi considerada uma violência contra as mulheres.
Em 2004, a comunidade deu início aos trabalhos com produção de alimentos nos quintais, criação de pequenos animais, resgate das plantas medicinais e dos remédios caseiros e com reeducação alimentar. A roça provocou uma dinâmica na comunidade em torno da construção e resgate do conhecimento sobre essas diversas questões e criou um ambiente favorável ao empoderamento das mulheres, que trocavam experiências nos intercâmbios em torno da temática de segurança alimentar e nutricional.
Formado agora por 7 integrantes, o grupo já se tornou referência no trabalho de gênero, agroecologia, segurança alimentar e nutricional, geração de renda e autonomia das mulheres. Através do GT Mulheres, da ANA, Articulação Nacional de Agroecologia, a experiência da roça agroecológica foi sistematizada e, junto com outras experiências nacionais, publicada na Revista Agriculturas – experiências em agroecologia, elaborada pela AS-PTA Agricultura Familiar e Agroecologia. Hoje, não só as mulheres da roça, mas as outras famílias do assentamento trabalham com a produção de alimentos, plantas medicinais e criação de pequenos animais em seus quintais. Para Dona Lúcia Pereira dos Santos, agricultora, a roça das mulheres representa muito. “Da roça, a gente tira tudo o que precisa. Temos de tudo lá. Hoje tem muita gente que está aprendendo com a gente aqui na comunidade através das visitas de intercâmbio. Com isso, nosso trabalho passou a ter mais valor”, conta. Dona Lúcia completa dizendo que nas viagens de intercâmbio aprendem muita coisa e sua vontade é que o grupo não se acabe nunca. Segundo ela a vontade é sempre de experimentar coisas novas. Agora estão criando galinha, através do fundo rotativo solidário.
A geração e a gestão da renda têm sido uma questão central nas preocupações das mulheres do grupo. A entrada de novas integrantes no grupo da roça tem ajudado a dinamizar a produção e a estimular as iniciativas de beneficiamento e de comercialização que estão sob o domínio exclusivo das mulheres. Apesar da falta de transporte local e da dificuldade com a situação da estrada, os produtos vêm sendo comercializados na Feira Agroecológica de Camamu e vendidos para o Programa de Aquisição de Alimentos, PAA, em parceria com a Agência de Assessoria e Comercialização da Agricultura Familiar do Baixo Sul, AACAF, que tem contribuído para impulsionar a iniciativa.