
Por JOSÉ GIACOMO BACCARIN*
O mito da autonomia do agronegócio esconde sua gênese estatal e dependência de crédito subsidiado, cujo dinamismo exportador convive com desmatamento, insegurança alimentar e reprimarização, exigindo uma reorientação estratégica que priorize o interesse nacional
A ubiquidade e iniquidades do agronegócio
O termo agronegócio ganhou um duplo caráter simbólico, entendido, por alguns, como a praga da lavoura e, por outros, como a salvação da lavoura. Neste caso, seu culto incensa a imagem de muito sucesso econômico e autossuficiência, independente da realidade e da política brasileira e vinculada à capacidade administrativa de seus empresários.
Na crítica a esta visão, inicialmente, convêm discutir a delimitação do agronegócio. Uma mensuração do seu PIB é feita pelo Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (CEPEA), da Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz” (ESALQ), da Universidade de São Paulo (USP), sob patrocínio da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA).
Em 2023 e 2024, estima-se que o PIB do agronegócio representou 23,5% do PIB do Brasil. Entre os seus quatro componentes, os agrosserviços predominaram, com participação de 40,0%, seguido pela agricultura propriamente dita, com 26,6%, agroindústria, com 24,0% e, por fim, insumos para agricultura, com participação de 5,4% (CEPEA, 2025).
Entende-se que esta contabilidade é exagerada, não conformando, sob o ponto de vista econômico ou político, um objeto analítico coeso e consistente. Exagera-se, por exemplo, ao considerar que as vendas de alimentos e outros produtos de origem agrícola nos supermercados, restaurantes, bares, lanchonetes, hotéis e similares façam parte do agronegócio. Exagera-se, também, ao se conceber como integrantes do agronegócio, empresas que realizam até o terceiro nível de transformação industrial de matérias primas agrícolas, quando o mais adequado seria limitar-se ao primeiro nível.
No comércio exterior, pelo contrário, há superestimativa dos resultados do saldo comercial do agronegócio, ao não se computar a importação de insumos. Segundo o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, em 2024, foi registrado saldo comercial de US$ 145,0 bilhões (Brasil/MAPA, 2025). Muito expressivo, mas que seria menor, se consideradas as importações de adubos e agrotóxicos, próximas a 80% do consumo interno.
O problema não é apenas contábil, mas de estratégia de desenvolvimento. A produção nacional de insumos e maquinário agrícola contou com programas específicos no Plano de Metas (1956-1960) e no II Plano Nacional de Desenvolvimento (1974-1980). Grande número de produtos finais dos agrotóxicos passou a ser produzido internamente, embora continuasse acentuada a dependência na importação de princípios ativos (Kageyama et al., 1990). No caso dos fertilizantes, 103 novas plantas, algumas estatais, foram instaladas entre 1955-1983, permitindo ao Brasil atingir a produção de 57% dos fertilizantes consumidos internamente, em 1990 (Bacha, 2004).
As reformas liberais de 1990 extinguiram as políticas de apoio à produção interna e reduziram as barreiras à importação dos insumos químicos, elevando a dependência à importação. No caso de tratores e colhedoras, parte da indústria automobilística, excepcionalmente, foi mantida a proteção tarifária, levando à obtenção de um pequeno saldo comercial positivo, atualmente.
O equívoco maior, contudo, é cometido quando as lideranças empresariais agrícolas esgrimem o argumento de que contam com pequena dependência de políticas públicas. Usam como prova o baixo nível do PSE (Subsídio Equivalente ao Produtor) que, no começo deste século, correspondia a menos que 5% da renda da agricultura brasileira, contra próximo a 30% nos países desenvolvidos (Rodrigues, 2006).
Isto é correto, mas é necessário entender o que mede o PSE, estimado pela OCDE (Organização para Cooperação para o Desenvolvimento Econômico). Ele contém dois componentes: um deles, os gastos orçamentários dirigidos diretamente aos agricultores, como preços mínimos. Outro componente, implícito, são as transferências de mercado dos consumidores para os agricultores, via tarifa de importação ou desvalorização cambial (OCDE, 2019). Mesmo que se considerem os gastos públicos gerais, com pesquisa agropecuária, ATER, etc., não incluídos no PSE, o protecionismo à agricultura brasileira permanece pequeno (Tangermann, 2005).
Entretanto, é questionável basear-se apenas nas medidas da OCDE para avaliar o real apoio público à agricultura e ao agronegócio. A agricultura continua mantendo um acesso privilegiado ao crédito bancário, com a obrigação dos bancos públicos e privados destinarem entre 25% e 30% dos depósitos à vista para empréstimos de curto e longo prazo, com taxas de juros fixadas pelo Governo Federal. Outras fontes compulsórias de crédito rural são porcentuais da poupança rural dos bancos públicos federais e cooperativos, dos Fundos Constitucionais de Desenvolvimento e do FUNCAFE (Fundo de Defesa da Economia Cafeeira).
Ademais, a partir de 2000, o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) passou a conceder crédito de investimento aos agricultores (Baccarin, 2011). Por fim, a Lei n. 11.076/2004 permitiu a criação de novos títulos de crédito e refinanciamento da agricultura e do agronegócio (Brasil/MAPA, 2007). Um deles é a Letra de Crédito do Agronegócio (LCA), isenta de tributação, que resulta da emissão de títulos por agentes financeiros com lastro nos contratos de crédito rural a receber, com 35% de sua arrecadação usados no crédito rural.
Na safra 2018/19, os recursos das exigibilidades sobre os depósitos à vista e a poupança rural representaram 53% do total de crédito rural no Brasil. Da LCA, vieram 16%, dos Fundos Constitucionais, 10%, do BNDES, 9%, de recursos livres, 7% e de outras fontes (incluindo Tesouro Nacional) vieram 4% (Brasil/MAPA, 2019). A participação direta do Tesouro Nacional, a única contabilizada no PSE, é bastante reduzida, mas a ação pública é fundamental para a disponibilização de grande parte dos outros aportes bancários ao crédito rural.
Estendendo o tempo histórico, é possível perceber a expressiva participação pública nas transformações tecnológicas da agricultura, desde a criação do Sistema Nacional de Crédito Rural, em 1965. Nela, além da exigibilidade sobre os depósitos à vista dos bancos comerciais, ficou estabelecido que, se necessário, o Tesouro Nacional complementaria a demanda dos agricultores por crédito.
Na década de 1970, a taxa de juros do crédito rural ficou, sistematicamente, abaixo da inflação e seu volume representou acima de 40% do PIB Agrícola. Entre 1966-85, a exigibilidade bancária deu conta de apenas 12% dos empréstimos concedidos aos agricultores e 80% vieram do orçamento monetário, forma de se registrar parte dos gastos públicos à época (Wedekin, 2005).
Os créditos de custeio vincularam-se à compra dos insumos modernos, adubos, agrotóxicos, sementes melhoradas, medicamentos veterinários, rações etc. Os de investimento permitiram que se adquirissem os tratores e colhedoras agrícolas. Na década de 1970, 67% dos fertilizantes, de 55% a 85% dos agrotóxicos e 90% dos tratores foram vendidos no Brasil através do crédito rural (Baccarin, 2011).
Outra ação pública fundamental foi a criação da Embrapa, em 1972. Sua importância para o desenvolvimento da agricultura brasileira pode ser resumida pelo fato de que em 51% da área cultivada com soja, em 2000, eram usadas cultivares da Embrapa. Ressalte-se que, com o advento da transgenia, esta participação caiu para 5%, em 2022, em favor de cultivares de empresas privadas (EMBRAPA, 2023).
Outro ponto que merece ser discutido é a tributação imposta à agricultura brasileira. Especificamente na tributação territorial, estudo do Instituto Escolhas (2019) mostra que o ITR (Imposto Territorial Rural) tem alcance insignificante, arrecadando R$ 1,5 bilhão, em 2018, menos de 0,1% dos tributos do Brasil. No mesmo ano, a arrecadação do IPTU (Imposto Predial Territorial Urbano) apenas da cidade de São Paulo alcançava R$ 9,9 bilhões.
Indo além e abrangendo as empresas industriais do agronegócio, pode-se elencar uma série de favorecimentos públicos ao longo das últimas décadas. Já foram citados os incentivos às empresas fornecedoras de tecnologias, devendo-se acrescentar os destinados às agroindústrias. De 1969 a 1977, tais empresas acessaram recursos creditícios baratos do Fundo Geral para a Agricultura e Indústria (Leite, 2001), além de vir mantendo participação significativa nos desembolsos do BNDES.
Alguns ramos agroindustriais foram contemplados com políticas específicas, como o de papel e celulose e produtor de farinha de trigo. A agroindústria sucroalcooleira foi favorecida com diversos programas, entre eles o Programa Nacional do Álcool (Proálcool), criado em 1975, que constituiu um novo mercado no Brasil, o do etanol carburante (Baccarin, 2011).
Não há como interpretar o sucesso produtivo e exportador do agronegócio brasileiro apenas com base na capacidade empresarial e nas forças de mercado. A presença pública foi fundamental e, talvez, devesse ser reforçada no presente momento, para que se enfrentassem alguns desafios da estrutura produtiva do agronegócio e seu papel no desenvolvimento nacional, em específico na recuperação da indústria de transformação brasileira.
Nesse ponto, destaquem-se alguns avanços, nos últimos 30 anos, como o aumento da exportação de máquinas agrícolas, a diminuição da exportação de madeira em bruto, baseada no extrativismo vegetal, e o aumento da exportação de papel e celulose, produtos industriais derivados de florestas plantadas, e o aumento do consumo interno de farelo de soja nas rações de animais confinados, que depois são exportados. Além disso, algumas atividades industriais, processadoras de matérias primas agrícolas, ganharam relevância nas últimas décadas, como a produção de biocombustíveis, derivados de soja, milho e cana-de-açúcar.
Ao mesmo tempo, podem ser apontadas debilidades, associadas à reprimarização econômica. Entre elas, o crescimento mais significativo da exportação de soja em grãos do que do farelo de soja e os aumentos concomitantes de exportação de algodão e importação de produtos têxteis. No mercado de insumos, aumentou a dependência da importação de fertilizantes e agrotóxicos, como visto.
Em relação aos problemas derivados de seu desenvolvimento, é importante perceber que, ao se julgarem autônomas, em termos econômicos, as lideranças empresariais do agronegócio entendem que não têm maiores obrigações sociais e ambientais. Mais do que isso, reagem vigorosamente às ações públicas que tentam aprimorar as condições de trabalho, dar maior perspectiva a pequenos agricultores, melhorar a situação de segurança alimentar e nutricional da população e estabelecer controles ambientais.
Um contraponto comumente levantado é o efeito da exportação sobre o abastecimento do mercado interno. No longo prazo, desde que haja aumento suficiente de produção e competitividade, a elevação da exportação de determinado produto pode vir acompanhada de aumento da quantidade ofertada e da queda de preço no mercado interno, além dos benefícios à renda nacional.
Entretanto, é importante levar em conta que os preços das commodities agrícolas são estabelecidos no mercado internacional, até certo ponto, independentemente das condições produtivas de determinado país. Bem como, deve-se considerar que as diversas atividades agrícolas disputam entre si as decisões de gastos/investimentos e do uso da terra dos agricultores.
No século XXI, a elevação real de 71% (FAO, 2025) dos seus preços internacionais, fez com que a população brasileira convivesse com aumento relativo dos preços dos alimentos. De 2007 a 2024, a variação de preços do grupo Alimentação e Bebidas foi de 282,4%, bem maior que a do conjunto de bens e serviços, medida pelo IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo), de 171,6% (IBGE, 2025).
Foi um aumento generalizado, que atingiu diversas cadeias agroalimentares, mais fortemente aquelas sem mercado internacional expressivo, cujas disponibilidades internas (produção mais importação menos exportação) tiveram pior desempenho (Baccarin et al, 2024). Alguns exemplos podem ser apontados, de 2007 a 2024, o preço do arroz ao consumidor brasileiro cresceu 261,7%, do feijão, 452,2%, de frutas, 437,4%, de hortaliças e verduras, 439,7% e de tubérculos, raízes e legumes, 364,6% (IBGE, 2025). Com exceção do arroz, todos os aumentos ficaram acima do constatado no grupo Alimentação e Bebidas.
Na questão ambiental, no mundo, o setor energia é o principal responsável pela emissão de GEE (Gases de Efeito Estufa), com mais de 50% de participação, seguido pela AFOLU (Agropecuária, Florestas e Mudança de Uso da Terra), com 24% de participação (FAO, 2022). No Brasil, a situação é diferente, com o setor de energia participando com 18% e a AFOLU, com 74% na emissão de GEE, em 2023 (SEEG, 2024).
O desmatamento na região de fronteira agrícola, para aumento da área com soja e pastagem, especialmente, pode ser apontado como principal causa da emissão de GEE no Brasil. A Figura 1, específica para a Amazônia, mostra que, após 1990, houve tendência de aumento do desmatamento até 2004, quando ele atingiu 27,8 mil Km2. Ações públicas de monitoramento e de intervenção tempestiva foram efetivas na redução desse nível, até 2014, quando se registrou 5,0 mil Km2 desmatados. Na fase com predominância da concepção de “Passar a Boiada” sobre a legislação ambiental, o desmatamento voltou a crescer, alcançando 13,0 mil Km2, em 2021. Os dois últimos anos, 2022 e 2023, apontam para nova tendência de redução, a ser confirmada nos próximos anos.

Figura 1 – Desmatamento anual da Amazônia, mil km2, Brasil, 1988 e 2023.
Fonte: INPE (2024).
O ciclo político do desmatamento dos biomas naturais para fins agrícolas parece evidente. Ele diminuiu em governos mais progressistas e favoráveis às regulamentações públicas e aumentou nos governos conservadores, com fortes vínculos às lideranças empresariais do agronegócio. Estas, aliás, mantiveram-se em destaque no apoio político e financeiro dos movimentos antidemocráticos observados no Brasil, após a eleição de 2022.
Elementos para uma abordagem alternativa
O Sistema de Produção Agroindustrial Brasileiro (SPAIB), comumente chamado de agronegócio, tem mostrado dinamismo superior ao de economia brasileira. De 1990 a 2022, o crescimento médio anual do PIB agrícola brasileiro foi de 3,0%, enquanto o da economia toda foi de 2,1% (IPEA, 2025). Em 1990, as exportações agrícolas brasileiras representavam 2,4% das exportações agrícolas mundiais, se elevando para 7,7%, em 2019 (FAO, 2021). Outro indicador aponta que o saldo comercial do agronegócio brasileiro passou de US$ 9,8 bilhões, em 1990, para US$ 145,0 bilhões, em 2025 (Brasil/MAPA, 2025).
Erram os que entendem tal acontecimento como uma volta ao Período Primário Exportador, que, em seu último ciclo, dependeu, fortemente, da produção e exportação cafeeira. Não são mais as condições naturais que justificam a retomada brasileira a um posto de destaque no mercado internacional agrícola. A explicação básica é a capacidade de adaptação da chamada Revolução Verde para as condições brasileiras, a partir da década de 1960, com resultados se evidenciando 30 a 40 anos depois. Também a ação de agroindústrias tem contribuído para a conquista de novos mercados internacionais, não apenas de produtos primários, mas também de semimanufaturados e manufaturados.
Erram também os que vêm o sucesso exportador atual como fruto do empreendedorismo dos “heróis” do agronegócio. Foi uma construção nacional, com participação significativa de políticas públicas, na pesquisa agropecuária, crédito rural e construção de infraestrutura. Pesquisadores e empresas públicas e privadas conseguiram acumular conhecimentos e tecnologias, responsáveis, em última instância, pelo dinamismo atual do SPAIB.
Esse sucesso econômico deve sofrer duas ordens de questionamentos, uma ligada às insuficiências de seu desempenho e outra à sua incapacidade de atender interesses sociais, de SAN e ambientais, de forma mais plena.
Duas debilidades podem ser levantadas quanto ao desempenho recente do SPAIB, uma delas a grande dependência à importação de insumos fundamentais para a agricultura moderna, em especial fertilizantes e agrotóxicos. Outra, a exportação de matérias primas agrícolas que poderiam ser processadas no Brasil e, depois, comercializadas, interna ou externamente. Nesse sentido, a estratégia nacional deveria priorizar a complementação da estrutura do SPAIB, com o fortalecimento de seus ramos industriais.
Todavia, não devem ser deixadas de lado algumas apreensões em relação à produção agrícola. Com o advento da transgenia, o conteúdo nacional (de empresas brasileiras, públicas ou privadas) na genética vegetal tem diminuído, destacando-se o acontecido com a soja. Mais amplamente, o sucesso até aqui alcançado no desenvolvimento de tecnologias agrícolas adaptadas para as condições brasileiras não garante que isso se reproduzirá no futuro. Há possibilidades de mudanças abruptas na forma de produção e na tecnologia agrícola, que podem exigir ir além do simples aprimoramento da Revolução Verde.
Ademais, todo o desenvolvimento tecnológico deve incorporar a preocupação com questões ambientais, em especial a intenção de neutralizar a emissão de GEE nas diversas atividades agrícolas. A produção de bioinsumos, diminuindo a necessidade de fertilizantes químicos e agrotóxicos, é outra frente a ser estimulada. Isto não, necessariamente, significa abrir mão de ganhos de produtividade da terra e dos rebanhos, mesmo porque a política pública não deve abandonar a intenção de zerar o desmatamento no Brasil em poucos anos.
Quanto à SAN, o Brasil tem conseguido, no século XXI, com retrocessos entre 2015 e 2022, melhorar as condições da segurança alimentar de sua população. Este fato dependeu muito do nível de atividade econômica e de políticas de melhoria de renda dos mais pobres, como a valorização do salário mínimo, o bolsa família e outros programas de suplementação de renda.
Entretanto, há uma contradição a ser enfrentada, o grande dinamismo exportador do SPAIB veio acompanhado do aumento dos preços dos alimentos à população brasileira. Entende-se que isto não deva ser encarado como algo inevitável, havendo espaço para ações governamentais de intervenção pontual em cadeias de exportáveis com aumentos exagerados de preços. Também faltam estímulos públicos para maior produção de hortaliças, frutas, arroz e feijão e outros produtos consumidos in natura, cujos preços ao consumidor aumentaram ainda mais que outros alimentos.
Na área ambiental, houve retrocessos na legislação específica. Mas entende-se que a maior dificuldade está no campo político, não se conseguindo orquestrar uma ação massiva que confronte os interesses dos grandes proprietários de terra. Estes, no mais das vezes, não apenas querem ter liberdade para desmatar, mas também continuar inibindo o acesso à terra por pequenos agricultores e permanecerem, praticamente, isentos do pagamento de impostos patrimoniais. Não há como separar a questão ambiental da situação do patrimônio fundiário, o que exige controle mais unificado e tempestivo dos cadastros de imóveis rurais.
Os pequenos agricultores continuam não atendidos, devidamente, pela política agrícola. A sugestão é que se desenvolvam ou fortaleçam pesquisas públicas com soluções tecnológicas viáveis, em termos econômicos, para pequenas áreas de terra, incluindo a produção de água e florestas. Conjuntamente, é necessário a ampliação dos serviços públicos, com corpo funcional permanente, de ATER, bem como ampliar a participação de pequenos agricultores no crédito rural e os canais oficiais para venda de seus produtos.
O termo agricultura familiar acabou por ganhar uma conotação mística e voluntarista, muitas vezes, não condizente com a realidade dos pequenos agricultores. Insistir nesse caminho, no entendimento deste autor, não contribui para diminuir a exclusão tão característica do desenvolvimento da agricultura e da sociedade brasileira. Pelo contrário, pela sua base irrealista, pode servir de catalisador da exclusão social.
*José Giacomo Baccarin é professor de Desenvolvimento agroindustrial e política agrícola na Universidade Estadual Paulista (Unesp).
Para ler a primeira parte dessa série clique em https://aterraeredonda.com.br/agronegocio-ou-agricultura-familiar/
Essa matéria foi publicada originalmente no site do A Terra é Redonda. Para acessar, clique aqui.



