III Encontro Nacional de Agroecologia reuniu mais de duas mil pessoas em Juazeiro, Bahia, para debater “por que interessa a sociedade apoiar a Agroecologia?”.

III Encontro Nacional de Agroecologia reuniu mais de duas mil pessoas em Juazeiro, Bahia, para debater "por que interessa a sociedade apoi

 

Entre os dias 16 e 19 de maio, mais de duas mil pessoas estiveram reunidas, na Universidade Federal do Vale do São Francisco (UNIVASF), em Juazeiro (BA) para debater “por que interessa a sociedade apoiar a agroecologia?”.  De acordo com Márcia Muniz, uma das coordenadoras do Serviço de Assessoria a Organizações Populares Rurais (Sasop), e representante da comissão organizadora local do III ENA, o encontro representou um processo de afirmação da Agroecologia em Juazeiro. “É uma região que  tem o agronegócio muito forte, inclusive com um evento anual direcionado a promovê-lo. Então precisamos visibilizar a agroecologia para fortalecer as inúmeras experiências que vêm sendo realizadas”, afirma.

 

O III Encontro Nacional de Agroecologia (III ENA), que teve o lema “Cuidar da Terra, Alimentar a Saúde, Cultivar o Futuro”, garantiu a participação de agricultoras, agricultores e diversos segmentos da sociedade, nos seminários, debates, lançamentos, oficinas e atividades culturais.

 

Um ponto forte do Encontro foi a “Feira de Saberes e Sabores”, espaço aberto aos moradores de Juazeiro e região, com produtos agroecológicos da agricultura familiar e dos povos e populações tradicionais de todo o país. Durante a feira, associações, cooperativas e grupos expuseram e comercializaram produtos agroecológicos, como alimentos, plantas medicinais, remédios caseiros, artesanatos, tecnologias sociais e outros. Ao todo, 35 estandes proporcionaram também trocas de conhecimentos relacionados às alternativas agroecológicas desenvolvidos nas propriedades dos agricultores/as do Semiárido Brasileiro.

 

Outro destaque da programação foi a realização de seminários temáticos simultâneos no terceiro dia de Encontro. Os participantes se dividiram para debater a luta pela reforma agrária e reconhecimento dos territórios dos povos e comunidades tradicionais; abastecimento e construção social de mercados; agricultura urbana; comunicação popular; conflitos e injustiças ambientais; construção do conhecimento agroecológico, educação no campo; normas sanitárias; plantas medicinais; financiamento; saúde e agrotóxicos; sementes e agrobiodiversidade; e sociobiodiversidade. Oficinas autogestionadas e instalações pedagógicas compuseram outras espaços de debate sobre disputas e conflitos nos territórios e regiões do País, trazendo resultados das Caravanas Agroecológicas realizadas ao longo de 2013, a partir de experiências concretas dos agrìcultores e agricultoras.

 

Atos Públicos

 

Os participantes do III ENA se dividiram em 4 diferentes atos públicos para chamar atenção da sociedade para as pautas da Agroecologia. Cerca de 100 pessoas protestaram em frente à unidade de pesquisa da Monsanto, em Petrolina. No local, são feitos experimentos com milho e sorgo geneticamente modificados. Foram colocadas diversas cruzes na entrada principal da multinacional, simbolizando as mortes provocadas pelos transgênicos e agrotóxicos. Além das cruzes, uma placa com os dizeres: “Fora Monsanto”,  foi colocada para identificar a Unidade.

 

Outro Ato aconteceu no Mercado do Produtor, em Juazeiro-BA, para denunciar o uso de um mosquito Aedes aegypti geneticamente modificado, ou transgênico, que está sendo testado no município com o pretexto de combater a dengue. Um grupo de 50 pessoas, entre agricultores e agricultoras, técnicos e pesquisadores da área distribuíram panfletos informativos com a população que circulava no mercado. Um balão gigante com o símbolo dos transgênicos e o desenho do mosquito foi colocado em cima de um carro de som, que acompanhou os manifestantes no local.

 

De acordo com Gabriel Fernandes, assessor técnico da AS-PTA Agricultura Familiar e Agroecologia e coordenador da Campanha Permanente Por um Brasil Livre de Transgênicos, o  Brasil é o único país a liberar a produção comercial do mosquito geneticamente modificado, já testado no Panamá, Ilhas Caimã e Malásia. Ele explica que a proposta da empresa inglesa Oxitec, que detém a patente do mosquito, é produzir um Aedes aegypti geneticamente modificado e liberar espécies machos desse mosquito no meio ambiente, que então deveriam cruzar com fêmeas nativas. Segundo a empresa, desse cruzamento surgiria uma larva que supostamente não sobreviveria, eliminando assim o mosquito. “O problema é que, primeiro, eles partem da lógica que eliminar o mosquito é o mesmo que eliminar a doença e, segundo, que ao liberar os machos podem ser liberadas também espécies fêmeas, pois o controle não é 100%, essas estariam livres para se reproduzir e não temos como saber o risco de mutações genéticas e o desequilíbrio ambiental que isso pode gerar”, alerta Gabriel Fernandes.

 

No mesmo horário dos outros dois atos, cerca de 300 mulheres camponesas, quilombolas, ribeirinhas, indígenas e  quebradeiras de coco ocuparam o escritório de apoio da Embrapa, em Petrolina (PE). Simbolicamente elas inauguraram a Embrapa Agroecológica, num ato de reivindicação para que a empresa de pesquisa trabalhe dentro de uma perspectiva de produção de alimentos saudáveis e diversificados. Elas também denunciaram a falta de políticas públicas voltadas para as mulheres camponesas e entregaram uma carta de reivindicações para o chefe-geral do Centro de Pesquisa Agropecuária do Semiárido, Pedro Carlos Gama, para que o mesmo a encaminhe ao presidente da Embrapa, Maurício Antônio Lopes.

 

O quarto e último ato reuniu todos os participantes do III ENA numa caminhada de cerca de dois quilômetros, saindo do campus da Univasf, em Juazeiro, até a ponte Presidente Dutra, que liga a cidade baiana a Petrolina, em Pernambuco. Os manifestantes fizeram a interdição da via e, na subida da ponte, um painel medindo oito metros de altura por 12 de largura denunciou: “Agrotóxicos e transgênicos matam. Apoio a agroecologia por uma vida saudável no campo e na cidade”.

 

 

Carta Política é entregue ao  Ministro Gilberto Carvalho

 

O encerramento do III ENA ficou por conta de um painel final, onde foi feita a leitura da Carta Política, com a presença do ministro Gilberto Carvalho, da Secretaria-Geral da Presidência da República. O documento foi entregue em mãos ao ministro, que afirmou que as propostas do campo agroecológico integram um “programa inteiro” de governo. “É um novo modelo de sociedade que precisamos implantar nesse país. É muito importante que vocês tenham essa consciência com papel inovador de vanguarda e profético que representam ao afirmar na palavra e não só no cultivo da terra, nas propostas que vocês apresentam. É de fato um enorme avanço e um sonho de sociedade que queremos e desejamos. E esse encontro, de alguma forma, prefigura o modelo de sociedade que nós sonhamos, porque vocês não falam só do cultivo da terra, vocês falam da relação com a natureza, com o alimento, a saúde, ambiente, e com a pessoas – a mulher, a criança, o outro”, destacou. O ministro pontuou ainda que sem uma reforma política, a Carta não se tornará realidade.

A Carta Política denuncia, entre outras questões, o crescimento dos conflitos socioambientais que expulsam as populações de suas terras; o crescente aumento do uso de agrotóxicos, que coloca o Brasil como o campeão mundial no consumo desses produtos, e o uso de sementes transgênicas. O documento exige do governo federal a criação de áreas livres de transgênicos e a não aplicação de recursos públicos para a compra de sementes transgênicas, proposta aprovada por aclamação pela plenária final do III ENA, sob as palavras de ordem “Agroecologia é vida, agronegócio é morte!”.

 

O III ENA foi encerrado às margens do Rio São Francisco com muita animação e tendo cumprido o objetivo de fortalecimento da Articulação Nacional de Agroecologia (ANA) como uma rede nacional, que mobiliza e atua politicamente.

 

Para o coordenador geral do SASOP, Carlos Eduardo Leite, o III ENA na Bahia representou para a entidade um coroamento da trajetória dos 25 anos*. “Com o evento na Bahia, fortalecemos nossa atuação no semiárido brasileiro. É um reconhecimento da nossa caminhada agroecológica pela convivência com o semiárido.”, conclui.

 

* SASOP completa 25 anos em julho de 2014.

 

Fontes: Articulação Nacional de Agroecologia (www.enagroecologia.org.br) e SASOP (www.sasop.org.br)

 

 

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